HISTÓRIA - EUROPA

A Revolução Agropastoril

Introdução

        Os primeiros agricultores europeus produziam basicamente o trigo das variedades emmer e einkorn, ervilhas, cera e papoula. Os bovinos predominavam, mas cabras e bodes eram igualmente criados. Poucos porcos e animais silvestres apareciam nos restos dessa cultura.

        Na Europa central, principalmente sítios tchecos, mostram contatos entre os caçadores mesolíticos e os agricultores neolíticos.

        O domínio da agricultura e do apascentamento de animais permitiu um crescimento rápido das comunidades neolíticas. Algumas, estabelecidas em áreas de ricas jazidas de matérias-primas (inicialmente líticas, como o sílex ou a obsidiana), progrediram a partir do comércio de tais produtos. Todo o processo foi acelerado à medida em que ferramentas mais novas aumentavam a produtividade do trabalho.

        O aumento das trocas entre as comunidades trouxe a especialização: algumas delas se dedicavam quase que apenas à extração da matéria-prima, enquanto outras ao fabrico de artefatos. Suas economias se complementavam com aquelas comunidades especializadas na produção do sustento dos industriários. Surgiram assentamentos de mineiros, agricultores ou artesãos, que deveriam ser vestidos, alimentados e defendidos por outros membros da comunidade ou por outras comunidades vizinhas.

         A hierarquização social também dava seus primeiros passos. Pari passu com a diferenciação entre as comunidades, os papéis sociais também tinham valoração distinta no seio das mesmas. Às mulheres e às crianças, cada vez menos aptas a manejar ferramentas maiores e mais pesadas, foram conferidos papéis domésticos, como criar os animais, fiar tecidos e administrar a casa.

        A diferenciação das fontes de matérias-primas e de meio-ambiente impunha a regionalização cultural, identificada pelo uso de ferramentas, produção e decoração de cerâmicas ou a utilização de vestimentas diferenciadas. Até o tamanho da comunidade e sua organização social eram moldados pelo meio-ambiente.

        A principal divindade deles era feminina e seu culto ligado à capacidade procriativa, simbolizando todas as formas de renascimento da vida, quer humana, animal ou vegetal.

        A Vida e a Morte eram meras facetas uma da outra, pois a mesma deusa que velava pela Vida guardava a Morte, possivelmente entendida como o renascimento para uma outro mundo. Estatuetas dessa mesma deusa povoam os túmulos neolíticos.

        Os meandros e espirais frequentemente desenhados nos ventres das deusas estavam associados ao mistério da Vida.

        Outro tema recorrente na Velha Europa era o da água, fonte de vida. Os zigue-zagues, meandros e divisas militares encontrados na cerâmica simbolizavam esse elemento. A deusa-pássaro estava associada às águas superiores, de onde as chuvas provêm. Deusas-pássaros eram representadas muitas vezes com pescoço longo e corpo ovóide, mesclando os símbolos das águas e da geratriz. Guardando as águas inferiores, eles tinham a deusa-serpente, responsável por liberar os brotos de dentro da terra.


Os Povos da Cerâmica Impressa Cardinal

        As populações que chegaram do norte e noroeste à Grécia por volta de 6.500 a.C. deram origem à fase denominada Pré-Sesklos do Neolítico heládico. Essa sociedade se caracteriza pela quantidade de cerâmica impressa que produzia. A princípio, essa cerâmica era decorada por impressão com barbante ou à unha, depois com o uso de concha de Cardium, o quê deu nome à esta cultura. Eles também faziam estatuetas de argila crua, de formato peróide, sem faces e às vezes decorada por incisão.

        O aumento populacional derivado da sedentarização e a excessiva exploração da terra, que atestadamente levou à queda na produção de trigo emmer, agravadas pela chegada de novas comunidades, impôs a necessidade de expansão territorial dessa gente.

        Na Grécia Central e Tessália, essa gente é absorvida na Cultura proto-Sesklos, dando origem à Cultura de Sesklos. Mas na Albânia e Macedônia, os pré-sesklosenses seguiram lentamente em direção ao oeste e já era identificado nas costas adriáticas cerca de 5.300 a.C., no sul da Itália por volta de 5.000-4.800 a.C. e nas costas tirrênicas por volta de 5.200 a.C.

        A cultura levada por essa expansão para o Oeste recebe o nome de Cultura da Cerâmica Impressa Cardinal. Sua expansão é bastante rápida, auxiliada pela existência vias marítimas. A cerâmica parece que precedia o pastoreio e só atrás vinha a agricultura, uma atividade que exige maior esforço físico e não confere status a seu praticante.

        O comércio intenso e o deslocamento de famílias para o estabelecimento de colônias nas costas européias e africanas no período 5.900-4.500 a.C. criou um caldo de cultura que acelerou o processo de neolitização da bacia do Mediterrâneo. Todavia, acredita-se que a expansão mediterrânea se deu mais por imitação, processo difusionista, que propriamente pelo deslocamento de povos. Por essa razão, não teria havido uma uniformidade linguística, mas apenas material, ao longo das costas desse mar.

        Sítios italianos guardam exemplares da cerâmica pintada e gravada (Cultura de Matéra, Ostuni, na Itália). Ali, surgem assentamentos de casas retangulares de adobe, cercados de fossas. As grutas são utilizadas para cerimônias religiosas e os mortos são enterrados sobre o lado esquerdo, dentro de fossas ou dentro das grutas.

        Ao chegar na costa mediterrânea francesa, entre 6.000 e 5.600 a.C., a Cultura da Cerâmica Cardinal, sem as peias restritivas dos Alpes, pôde se expandir para o interior, atingindo o vale do Rhône, a Suíça e o sul da Alemanha. Da síntese deles com os grupos Tardenoisenses locais, resultaria a Cultura Roucadour por volta de 3.800 antes da Era Cristã. E na Alemanha, o resultado seria a Cultura La Hoguette, em que a cerâmica revela influência mediterrânea, mas o conjunto lítico demonstra a continuidade da indústria mesolítica.

        O processo de filtragem cultural fêz chegar à Ibéria um neolitismo sem agricultura e sem pecuária. Os sítios espanhóis mais antigos (c. 6.000 a.C.) mostram apenas cerâmicas atestando a neolitização de suas tribos.

        A arquitetura das casas dos povos da Cerâmica Impressa Cardinal também se modificou em seu trajeto ao longo das costas mediterrâneas. De planta quadrada na Grécia, passou a ter planta redonda em alguns sítios na Itália, França e Ibéria, talvez adotando o costume das populações autóctones dessas regiões.

        Embora tenham se tornado criadores de carneiros e cabras e até agricultores, alguns dos europeus aculturados ainda viviam em grutas ou abrigos sob rochas na fase inicial de neolitização.

        Os mortos eram sepultados em fossas recobertas com lajes de pedras retangulares dentro das próprias casas. Alguns grupos praticavam a trepanação de crânios, mas se ignora se por motivos religiosos, mágicos ou culturais.

        A deusa-mãe da fertilidade foi adotada pelas comunidades indígenas porque não mais fazia sentido para eles venerar os bosques e os animais, uma vez que sua sobrevivência passou a depender dos humores dos deuses da chuva, do vento, da terra, da germinação e assim por diante.


Os Povos da Cultura de Starcevo

        A Cultura de Starcevo nasceu por volta de 5.800 a.C. no seio da Cultura de Sesklo, fruto da expansão da civilização neolítica rumo ao centro da Europa. Identificada inicialmente na região de Belgrado (Iugoslávia) e nas margens norte do Danúbio. Eles formam a população mais antiga de agricultores e criadores de gado da região balcânica central.

        As manifestações culturais mais antigas da Cultura de Starcevo datam do Neolítico Médio, cobrindo uma área gigantesca, que abrangia os atuais territórios da Eslováquia, Ucrânia ocidental, Romênia, Hungria oriental, Bulgária, Sérvia e nordeste da Bósnia. Estendeu-se até a região de Vucedol, na Croácia.

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        Como seus ancestrais vindos da Anatólia, eles viviam em casas quadradas feitas de adobe, assentadas sobre monturos artificiais ("tells").

        Objetos em osso do sítio de Kovacevo (Bulgária) apresentavam técnicas e tipos de ferramentas típicos da esfera cultural minor-asiática dos milênios VIII e VII a.C., tais como o uso de tíbias caprinas para picotar a cerâmica, cabos de foices feitas de ossos de cervídeos, estatuetas humanas e o tratamento térmico dos ossos usados como utensílios. Esse conjunto de fatores leva à crença de que a origem cultural, e possivelmente a étnica também, do povo de Kovacevo estaria no atual território turco.

        Sua cerâmica era crua e tinha os bordos impressos por pressão dos dedos ou unhas. Os vasos esféricos tinham bases achatadas, às vezes sobre um suporte aneliforme. Muito poucas peças eram pintadas.

        Possivelmente, a pesca nos rios providenciava a dieta básica, complementada pela caça e, subsidiariamente, os frutos da agricultura, ainda pobre em variedade.

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        Eles se subdividiram em diversas subculturas regionais, decerto adaptações dos diferentes substratos culturais que adotaram os traços culturais dos povos de Starcevo. As principais subculturas foram: Starcevo, Cris, Körös, Dudesti, Tchavdar, Ovtcharovo, Conevo, Karanovo e Anzabegovo.

        Os povos do oeste criavam bois, enquanto os de Körös apenas cabras e carneiros. A figura abaixo mostra diversos exemplos das cerâmicas feitas por esses povos.

        A religião deles seguia a tradição minor-asiática do culto à Deusa-mãe da fertilidade.

A Cultura de Vinca

        A Cultura de Vinca apareceu por volta de 5.400 a.C., na fase conhecida como Vinca-Turdas, na região onde hoje estão a Iugoslávia, Bósnia, Herzegovina. Durou até 4.800 a.C.

        Seus membros tinham crânios dolicocéfalos, a exemplo dos povos mediterrâneos.

        Depois, evoluiu para a fase chamada Vinca-Plocnik (4.800-4.500 a.C.).


Os Povos das Estepes

        Enquanto as Culturas das Cerâmicas Cardinais e das Cerâmicas das Faixas Lineares se espalhava pela Europa, inúmeros povos Cro-Magnon mesolíticos viviam há cerca de 30 mil anos nas estepes russas e do Casaquistão, estendendo-se das montanhas Altai, na fronteira da China, até as costas do mar Báltico. Eles são genericamente chamados de pônticos, termo derivado do nome que os romanos deram ao mar Negro: Pontus Euxinus.

        Esses Cro-Magnons eram altos e tinham rostos largos (braquicéfalos), como se constatou na análise dos esqueletos que não foram calcinados.

        Há sítios dessa gente na Ucrânia (Mezhirhich, do período 35.000-15.000 a.C), na Rússia (Kostenki, do período 50.000-35.000 a.C.) e na Sibéria (Makarovo e Kara-Bom, do período 50.000-35.000 a.C. e Malaya Siya, do período 35.000-15.000 a.C.).

        Tudo indica que aqueles grupos das áreas mais próximas às grandes civilizações do Oriente Médio e  da Ásia Menor (Turquia, Armênia, Geórgia, Azerbaijão e Irã) acabaram por entrar em contato com o processo de neolitização através do Cáucaso.

        Na região em torno dos mares Negro, Azov, Cáspio e Aral, os povos mesolíticos ali moradores mantinham constante contato com os sinais d e uma economia baseada na agricultura e no pastoreio emanados do Oriente Médio, Anatólia e dos povos da Cultura de Sesklo.

        Muito lentamente, grupos de caçadores-coletores adotavam aspectos das culturas dessa área pujante. Atraídos pelos solos férteis, também os primeiros colonos dessas regiões aportavam às estepes russo-ucranianas.

        O contato trazia novas formas de produção e novas modas, criando na região manifestações culturais próprias, fruto do modo com que internalizavam os sinais vindos das áreas neolíticas vizinhas.

        Essa aculturação, por sua vez, se transmitia de comunidade em comunidade pela migração de famílias em busca de novas terras para seus gados (tese colonialista) ou pela imitação desse modo de vida pelos nativos (tese difusionista). O mais provável é que tenha ocorrido um misto das duas formas e que os nativos adotassem técnicas que observavam em colonos que vinham para seus territórios.

        O pacote neolítico, entretanto, não parece ter sido portado por um número muito grande de colonos, porquanto os nativos não adotaram o conjunto de crenças das populações dos Bálcãs. Isso é atestado pela continuidade do rito funerário de sepultamentos sob monturos de terras e pedras.

        Os povos das estepes em contato com a onda neolítica também não abandonaram a técnica lítica herdada do Mesolítico, nem a dieta fortemente baseada na caça de bisões, cervos e porcos selvagens, ou a pesca de carpas, lúcios e enguias.

Na área dos mares Negro e Azov

A Cultura do Bug-Dniestr

        Um número crescente de grupos de caçadores e coletores de frutos da área às margens e entre os rios Bug e Dniestr ia adotando pouco a pouco alguns modismos neolíticos a partir de meados do VII milênio antes da nossa era.

        Tais modas se transferiam de comunidade a comunidade quando imprescindíveis para a sobrevivência ou por mera imitação (tese difusionista) ou, ainda, pela migração das famílias que as adotavam. O mais provável, diante da quantidade de habitantes do continente àquela época, é que tenha ocorrido um misto dos dois processos e que a adoção se deu pela observação e aceitação dos hábitos das famílias de colonos vindos de áreas já neolitizadas.

        A princípio, a chegada do pacote tecnológico neolítico à área parece demonstrar que os deslocamentos humanos de populações dos Bálcãs para as estepes não foi avassaladora, pois as crenças dos nativos das estepes não foi afetada, a julgar pela manutenção de seu rito  funerário original, da dieta baseada na caça  (de cervos, bisões e porcos selvagens) e na pesca (de carpas, trutas, lúcios e enguias), e da indústria lítica.

        A provável adoção imitativa do pacote neolítico implica na manutenção de sua própria língua materna, enriquecida pela incorporação de neologismos estrangeiros relativas às novas aquisições tecnológicas (léxicos para o arado, a canga, o cercado, a ração etc.).

        Os povos da área entre os rios Bug e Dniepr passaram a cultivar espécies agrícolas nos solos negros da região por volta de 6.500 a.C., principalmente uma forma selvagem de trigo. Junto, passaram a criar animais como as ovelhas e vacas.

        Seus primeiros vilarejos ficavam em terraços perto dos rios. Suas casas, semi-enterradas no solo, eram feitas de madeiras e barro. Num segundo momento, a pedra viria a substituir esses materiais, indicando a chegada de uma nova etnia ou uma nova moda à área.

        Sua cerâmica mais antiga foi datada de 5.800 a.C., feitas a mão, sem o uso de torno. Sua base não era achatada, mas redonda ou pontuda, baseada nas panelas e receptáculos feitas de pedras por seus ancestrais.

        Parece que os corpos eram enrolados em peles e preservados em ocra vermelha, como feito na cultura mesolítica báltica de Zvejnieki.

A Cultura de Surs'k

        Essa cultura existia na área ao norte do mar Negro, possivelmente na atual Criméia. Viviam basicamente da pesca.

        Por volta de 5.500 a.C., seus territórios receberam levas de famílias da Cultura do Dniepr-Donets, trazendo a agricultura e a criação de gado.

A Cultura do Dniepr-Donets

        A Cultura de Dniepr-Donets tem sido datada de 6.000-4.000 a.C. As pessoas de suas tribos eram igualmente do biotipo Cro-Magnon (ou proto-europeu): pessoas grandes e robustas, de faces largas (braquicéfalas).

        Seu território permitia contatos dessas populações com as gentes já neolitizadas da área do Bug-Dniestr e, talvez, com povos caucasianos que teriam recebido um estilo de vida neolítico do norte da Ásia Menor. A leste, tinham contato com os pônticos das estepes dos Quirguizes (que por sua vez mantinham ligações com grupos neolíticos do Casaquistão e da Ásia Central).

        A análise de seus dentes evidencia uma dieta rica em proteínas (caça pescas e nozes). O consumo de vegetais era mínimo. Ou seja, teriam seguido o estilo de vida mesolítico ou sua neolitização se embasou na pecuária e na produção de cerâmica, mas não na produção agrícola.

        Sua cerâmica guarda semelhanças com a da cultura báltica de Memel.

        São conhecidos cerca de 30 cemitérios dessa gente. Algumas poucas covas têm apenas um indivíduo sepultado. A grande maioria é de covas coletivas, quiçá jazigos familiares.

        Os mortos eram depositados numa cova rasa, em posição estendida, e cobertos com ocra. Junto deles eram postos objetos ornamentais, feitos em dentes de animais, em presas de javalis ou em conchas.

        Os ritos funerários deles eram semelhantes aos da vizinha Cultura do Bug-Dniepr e da Cultura de Zvejnieki. Revisando o conjunto de sítios, percebeu-se semelhanças entre essa cultura e aquela dos povos do médio Volga (Cultura de Samara) que afastaram a hipótese de meras concidências. Suspeita-se, então, da existência de um gigantesco horizonte cultural comum abrigando as populações entre o médio Dniepr e o médio Volga. Para alguns, esse seria o núcleo original dos indo-europeus, enquanto outros interpretam-no como um núcleo pré-indo-europeu que teria sido absorvido pela esfera indo-européia quando grupos pecuaristas das estepes (sub-urálicas e transcaucasianas) se moveram para o oeste.

        A Cultura do Dniepr-Donets  se estendeu na direção sul, para o mar Negro, por volta de 5.500 a.C., movimento que alguns querem associar ao Dilúvio da Bíblia. Segundo uma hipótese recente, o mar Mediterrâneo, que ficava a cerca de uma centena de metros acima do nível do mar Negro, teria subido em função do degelo nas calotas polares e rompido uma barreira de montanhas onde hoje é o estreito de Bósforo, despejando toneladas de litros de água por segundo no mar Negro, numa cascata cujo estrondo teria sido ouvido a milhares de quilômetros. Esse súbito ingresso de água do mar Mediterrâneo teria provocado a enchente dos rios vizinhos e refletido até no Oriente Médio, criando as histórias da Grande Enchente bíblica e a Lenda de Gigamés. Fugidos dessa enchente, grupos da Cultura do Dniepr-Donets teriam migrado para as áreas em volta, inclusive transcarpáticas.

Na área do Médio Volga

A Cultura de Samara

        Entre 6.000 e 5.000 a.C., os povos do Médio Volga eram identificados por tradições que foram batizadas de Cultura de Samara.

        Ela mostra sinais muito assemelhados aos da Cultura do Dniepr-Donets, principalmente em relação ao rito funerário: covas rasas, posição estendida do corpo, cobertura de ocra e acompanhamento funerário de objetos trabalhados em dentes de animais e em conchas. Um bom exemplo dessa cultura está no cemitério de Sezzheye.

        Vários dos acompanhamentos funerários mostram a figura de cavalos, bovídeos e patos. Nesses túmulos também foram encontrados esqueletos de cavalos, provavelmente sacrificados no ritual fúnebre. Não se tem certeza se tais animais eram domesticados ou selvagens.

        A Cultura de Samara tinha também contatos com os povos das Culturas das Florestas que viviam ao norte de seu território, falantes de dialetos urálicos. Talvez a própria gente de Samara fosse da esfera linguística uralo-altaica.

        A descoberta de minas de cobre nas proximidades dos Urais por volta de 5.000 a.C. teve impacto profundo sobre as populações vizinhas, criando um novo horizonte cultural na área da Cultura de Samara: a Cultura de Khvalynsk.


A Cultura da Cerâmicas de Faixas Lineares

        Enquanto a Cultura da Impressão Cardinal se difundia na faixa costeira do Mediterrâneo, no centro da Europa (região da Hungria, da República Tcheca e da Eslováquia), um ramo dos Starcevianos ia se destacando dos demais pela forma de decorar sua cerâmica, usando largas faixas policrômicas. Por isso, ficaram conhecidos como os povos da Cultura das Cerâmicas de Faixas Lineares. Entre os arqueólogos, popularizou-se seu nome alemão: Linienbandkeramik (LBK). Seus primeiros traços datam de 5.400 a.C. e foram encontrados no atual território húngaro.

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        O pastoreio seguiu-se à introdução da cerâmica nesse território. Já a agricultura chegou muito mais lentamente, atingindo o baixo Tisza (Hungria) por volta de 5.000 a.C. Ali estacionou ou progrediu muito lentamente pelo Danúbio superior e seus afluentes.

        Um ramo dessa gente rumou para o norte, instalando-se na bacia ocidental do Dvina, na Rússia, ali criando a Cultura Rudnyanskaya, que durou entre 6.200 e 5.800 a. C.

        A uniformidade dos componentes culturais dessa gente apontam na direção de que o processo de neolitização dessa parte da Europa deveu-se preponderantemente à migração de povos e não à difusão de suas idéias e modo de vida.

        Como os povos neolíticos eram os únicos ceramistas da Europa Central e seu gado não era nativo da região, pode-se igualmente concluir que houve sim um processo de movimento de povos e não apenas de técnicas no seio dessa Cultura, exceto nas Planície Germânica e  Escandinávia. Os antigos residentes teriam, assim, sido progressivamente excluídos dos territórios tomados. De fato, o tipo Cro-Magnon clássico desapareceu dos sepulcros nessa região, até que uma degeneração climática os forçou a migrar para o sul séculos mais tarde.

        Essa nova cultura era caracterizada pela decoração de suas cerâmicas com linhas incisas formando largas faixas. As cerâmicas de faixas lineares mais antigas foram encontradas no sítio tcheco de Marovský Plumlov, na Moravia, e datadas de 5.700-5.500 a.C. O estilo é também encontrado na Hungria ocidental e na Alemanha.

constrFaixasLin1.gif (4980 bytes)        Outra característica dessas gentes são suas longas casas retangulares, que atingiam até 45 metros de extensão.

        A pobreza em argila apropriada, em conjunto com a enorme disponibilidade de madeiras, determinou uma revolução arquitetônica no centro da Europa. As habitações dessas comunidades eram casas longas, sem paralelo com os estilos do sul da Europa ou do Oriente Médio. Geralmente se juntavam em pequenos grupos. Suas paredes eram feitas de madeiras espaçadas e os vãos preenchidos com argila. O interior das casas era tripartido, para uso em três funções distintas. Nelas se abrigavam as pessoas e os animais. Parece que esse acúmulo de seres respirando servia para manter o ambiente aquecido. Um cômodo era destinado ao trabalho das pedras, couros, têxteis e grãos.

        Os fornos eram cavados no chão, no exterior das casas, e apresentavam formas esféricas bastante padronizadas. A colheita era guardada nas proximidades das casas, dentro de covas em formato de sino.

        Os mortos dessa cultura eram depositados em covas funerárias, em posição flectida e deitados sobre o lado esquerdo. As tumbas, por vezes um conjunto delas,  ficavam no interior das aldeias.

        A produção lítica em geral prosseguiu a tradição mesolítica local, exceto no instrumental agrícola, uma inovação trazida com a neolitização, que era bastante padronizado e composto basicamente de micrólitos trapezoidais com os quais faziam machadas, foices, sulcadores etc.


As Comunidades Balto-Escandinavas

Os Povos da Área Báltica

A Cultura dos Utensílios Decorados a Micropentes

        Por volta de 6.000 a.C., nas regiões de florestas do Báltico, Bielorússia e área de Moscou vegia a Cultura dos Utensílios Decorados a Micropentes, assim denominada por apresentar cerâmicas decoradas com faixas de microsulcos, como se feitas por pentes de poucos dentes.

        Esse horizonte tem duas acepções distintas: tanto se aplica à cultura que existia por volta de 6.000 a.C. na área ao norte do pântano de Pinsk até o mar Báltico Ucrânia e oeste da Rússia, quanto à miríade de culturas regionais na região que partia do oeste dos Urais (ao norte da Cultura de Samara, isto é, ao norte do rio Kama), passava ao norte do rio Desna e se dirigia ao Báltico, num leque que ia da cidade finlandesa de Vaasa à cidade russa de Kaliningrado. Nesse conjunto se pode incluir as culturas de Narva (Letônia, Lituânia e Estônia), Sperrings (Finlândia), a dos Utensílios Decorados a Micropentes anteriormente descrita, a de Syalovo (ou do Oka-Alto Volga), a de Kama e a dos Urais.

        As semelhanças entre si e as diferenças delas em relação às culturas do mar Negro e Cáspio permitem classificá-las cum bloco próprio.

        Qualquer que seja o conceito, essa cultura ocupava a área de florestas no noroeste europeu.

        O meio de vida dessa gente ainda era muito semelhante ao do Período Mesolítico. Sua dieta era baseada na caça, pesca e coleta de frutos silvestres. Caçavam aqueles animais típicos da Europa setentrional: cervos, veados, ursos, javalis, bisões, castores, lobos, raposas, linces, martas, lontras etc. Nos sítios costeiros, a caça à foca fornecia a gordura e a carne de que necessitavam.

        Os utensílios e ferramentas também atestam um modo de vida epimesolítico.

        Escolhiam sistematicamente as áreas lacustres, fluviais ou marítimas para seus habitats. Há poucos sinais de assentamentos deles nas áreas interioranas, indicando um acentuado nomadismo. Já na faixa costeira, a pesca e coleta de frutos do mar permitiram um sedentarismo mais duradouro. Numa fase posterior da cultura, passaram a fazer construções mais permanentes, geralmente casas de 8x5 metros quadrados, semi-afundadas no chão.

        A cultura lituana de Narva apresenta sinais de atividades agropecuárias: a descoberta de foices indica a produção (ou ao menos a coleta) de cereais. Criavam carneiros e cabras.

        Sua cerâmica era muito decorada, tendo aves aquáticas como tema recorrente.

        Alguns especialistas defendem que essa genta falava dialetos urálicos, posto que sua economia se ajusta ao vocabulário proto-urálico reconstruído. Outros vêem nos topônimos locais um substrato diverso do urálico e do indo-europeu, principalmente na área do Oka-Alto Volga. Esse segundo grupo acresce que a existência de empréstimos linguísticos indo-iranianos nas línguas urálicas mostrariam que a dispersão dos falantes de dialetos urálicos teria ocorrido numa época posterior à das diversas variantes da Cultura dos Utensílios Decorados a Micropentes.

        Ela persistiu até o advento da metalurgia do cobre, por volta de 3.500 a.C. Mas o desfecho dessa cultura ainda suscita discussões entre os cientistas, pois nessa região a Cultura dos Utensílios Decorados a Micropentes (Báltico, Rússia central e norte da Ucrânia) se fragmentou entre as culturas do horizonte Utensílios Decorados a Corda (Achas de Batalha, Fatyanovo, Médio Dniepr e outras, normalmente associadas aos movimentos iniciais dos povos de fala indo-européia). Todavia, algumas dessas culturas apareceram em locais onde não há sinais de assentamentos de tribos indo-européias (notadamente na Rússia central) e lá o horizonte dos Utensílios a Corda parece ter sido assimilado (cultural e linguisticamente) pelos descendentes dos Utensílios Decorados a Micropentes.

A Cultura de Rudnsyankaya

        A Cultura de Rudnsyankaya teve início na bacia ocidental do Dvina, na região noroeste da Rússia, nas atuais Letônia e na Lituânia, fruto do contato de grupos proto-neolíticos do Báltico ocidental, talvez da Cultura Ertebølle, com aborígenes russos no Ótimo Holoceno. Essa cultura teria existido entre 6.200 e 5.800 a. C. e deixado monumentos como os de Osa, Zvidze e Akaly.

        Com o aquecimento do clima do Atlântico norte (Período Atlântico, 7.000-3.900 a.C.), a área de floresta se expandiu. Comunidades Rudnsyankayas migraram para o leste, dando origem à Cultura Serteyskaya.

        Os povos dessa cultura se instalavam em áreas arenosas nos inícios ou desembocadura dos rios e provavelmente baseavam sua alimentação na pesca.

        Suas cerâmicas não eram cozidas no fogo, mas secadas a baixas temperaturas. Era decorada por picotes, assemelhadas àquelas feitas entre as regiões de Azovo, nas proximidades do Mar Cáspio, e as das estepes e florestas da Europa Oriental.

        Eram provavelmente grupos semi-nômades, pastores de ovinos e caprinos.

Os Povos da Área Escandinava

A Cultura de Maglemose

        Na área do Báltico, seguia a Cultura Maglemose.

sep_Skateholm.jpg (6332 bytes)        Um cemitério encontrado em Skateholm, datado de 5.200-4.900 a.C., guarda os restos de um homem que parecia ser importante nessa comunidade. O esqueleto mostra sinais de que ele teria sobrevivido a um ataque de javali e apresenta uma ponta de flecha de sílex fincada no osso pélvico, mostrando ter batalhado contra outra comunidade ou ter sofrido um acidente de caça ao ser atingido por algum companheiro. Sua cabeça foi retirada e depositada a seus pés, como significando que os pés ficaram silentes.

 

        Nos túmulos dos Maglemoses, é frequente encontrar sinais de aspersão de ocra vermelha sobre os animais (ou parte deles) ali colocados.

        Outras covas dele apresentam ossos de cães, possivelmente o único animal doméstico que conheciam. Esses animais tiveram seus pescoços quebrados e foram enterrados ao lado dos donos.

        Numa cova Maglemose na Dinamarca, uma criança foi sepultada sobre uma asa de cisne. Num cemitério da região de Bäckaskog, uma senhora foi enterrada portando uma lança de ponta óssea e um buril.

A Cultura de Zvejnieki

        Tal cultura foi identificada no período 7.000-5.000 a.C. no norte da Letônia (lago de Lett-erers, Burtnieku Ezers)

        Enrolavam seus mortos em peles e os preservavam em ocra vermelha. Em suas covas foram achados colares e pendentes de dentes de animais (cervos, javalis, lobos, raposas) e oferendas de pássaros. Também no sítio haviam esculturas em madeira de cervos e pássaros.

 

O Neolítico Intermediário


Criado e administrado por Marco Polo T. Dutra P. Silva