Introdução
As raízes da agricultura e da pecuária européia se encontram no chamado Período Natufiano, que aconteceu entre 10.000 e 8.000 a.C. no Oriente Médio (Mesopotâmia, Israel, Palestina e Egito) e Ásia Menor (Turquia e Iraque), quando ocorreu uma lenta, mas contínua, transição das comunidades nômades de caçadores-coletores em comunidades sedentárias agro-pastoris. A essa fase de aculturação para uma base econômica agropecuária dá-se o nome de Período Neolítico.
Na Europa, a expansão Neolítica começou pela faixa mediterrênea por uma razão bem simples: era ali que as variedades de plantas cultivadas na área Natufiana encontraram condições climática mais favoráveis. Mais tarde, quando novas espécies foram adaptadas para os climas mais adversos, a agricultura pôde avançar para o centro e o norte da Europa. Mas aí se defrontou com uma região recoberta por florestas densas, fruto do Período climático Atlântico, com manchas de aluvião nos vales e bacias fluviais.
A Europa de então conhecida uma faixa costeira, tanto mediterrânea quanto atlântica, mais povoada e um interior praticamente despovoado. Evidentemente isso determinou diferentes velocidades de expansão neolítica. Na faixa litorânea, mais densamente povoada, muito da neolitização se deu por um processo de difusão cultural sobre as comunidades mesolíticas, enquanto a zona central européia possivelmente foi aculturada por um processo dêmico. Isso explicaria as diferentes culturas que se estabeleceram nas duas áreas e que veremos adiante, a dos Cerâmica Impressa Cardial da Itália, França, Espanha e Portugal e a dos Cerâmica de Faixas Lineares dos Bálcãs e Europa central.
O Homem do Neolítico Europeu
A análise dos ossos encontrados nas necrópoles da Europa Central mostra que os fazendeiros neolíticos tinham crânios leptodolicomórficos, tipicamente mediterrâneos, enquanto os povos mesolíticos tinham crânios do tipo Cro-Magnon clássico. Esse tipo Cro-Magnonóide se tornaria pouco comum na Europa até por volta de 1.000 a.C., quando a deterioração climática os empurrou rumo ao sul.
Em Portugal, estudando a comunidade de Muge, perto da foz do rio Tejo, o arqueólogo João Zilhão também identificou diferentes origens entre as comunidades mesolítica e Neolítica.
Em relação à antropometria dos indivíduos, a análise dos esqueletos encontrados no sítio de Vaclav-Vancata (República Tcheca) revelou que o homem neolítico era menor que o paleolítico, certamente decorrente de câmbios no ecossistema em que vivia, porém robusto. E as fêmeas neolíticas eram bem mais frágeis e leves que suas companheiras paleolíticas. A locomoção dinâmica também mudou: no Neolítico, a vida era mais sedentária para as mulheres que para os homens, embora ambos fossem mais sedentários que as famílias paleolíticas. Essa distinção entre machos e fêmeas retrata uma nova divisão de trabalho entre os sexos. No Neolítico, ao homem ainda competia caçar e trabalhar a terra, enquanto à mulher foi atribuída a adminstração doméstica.
Alguns estudiosos identificaram a sociedade deles como matriarcal, mas esse ponto não é consensual, pois os jazigos não demonstram diferenciação social entre os sexos. Ademais, numa sociedade igualitária, não haveria liderança: não haveria um patrimônio familiar nem uma posição de comando a ser transmitido.
Às mulheres seriam atribuídos o trabalho agrícola, a administração da casa, a manufatura de cerâmicas e têxteis e a cargo dos homens ficaria a caça e a fabricação de utensílios de pedra e ossos. Algo muito parecido com o que acontecia com as sociedades indígenas brasileiras.
A elas também caberia o papel mais importante nos cerimoniais religiosos, inclusive a fabricação da cerâmica litúrgica e a preparação dos alimentos dos deuses e dos defuntos.
Segundo alguns linguistas, seriam falantes de dialetos da língua geral (o proto-indo-europeu) que se difundiu pela Europa, norte do Oriente Médio e atingiu o Paquistão. Essa tese encontra muitas resistências e os próprios autores já a revisam. Entre os principais argumentos contra ela, dois se destacam. Em primeiro lugar, a Anatólia, de onde essa gente viria tem uma fauna e uma flora que não foi levada por esses migrantes e, reversamente, nomes de plantas e animais inexistentes na pátria-mãe deles se difundiram por todas as línguas derivadas do grande grupo proto-indo-europeu. O segundo argumento mostra que se fosse verdadeira esta tese, haveria um contínuo dialetal eentre os povos mais próximos da Anatólia e os mais distantes, o que não se observa.
As Primeiras Comunidades Neolíticas da Europa
Fase Acerâmica
As primeiras comunidades Neolíticas da Europa foram encontradas na Tessália. Na caverna de Franchti, já habitada desde o Período mesolítico, se identificou uma alteração brusca no modo de vida. Desapareceram abruptamente os sinais de uso do centeio, cevada, lentilhas e ervilhas selvagens. Pela primeira vez surgem o trigo emmer e formas domesticadas de cevada e lentilha. Igualmente repentina é a criação de carneiros e cabras domésticos. Essa mudança radical parece indicar a chegada de populações novas. Nesse Período inicial, essas comunidades consumiam também a ervilhaca, pistaches e olivas silvestres. Em sua primeira fase, por volta de 6.500 a.C., as comunidades européias recém-neolitizadas não sabiam fabricar cerâmicas.
Outro centro dessa época é o sítio de Arguissa, situada sobre u'a magoula (um cerro em forma de cone truncado), cuja cultura perdurou de 6.500 até 5.800 a.C. Em suas estratigrafias mais antigas não se encontrou cerâmica cozidas, mas sinais de tentativas de fabricar vasilhas secas ao sol. Esse assentamento foi identificado como permanente pelos sinais de lareiras e assoalhos de seixos. As habitações eram cabanas semi-enterradas no solo. Entre 30 e 60% das pedras usadas para fabricar instrumentos líticos era o obsidiana, sugerindo comércio com outras comunidades.
também as comunidades cipriotas já produziam cereais (trigo e cevada) e pastoravam ovinos e bovinos domesticados por volta de 6.500 a.C. Viviam então num contexto acerâmico, a exemplo dos vizinhos continentais, utilizando-se de vasilhas de pedra para os afazeres domésticos. Aparentemente, a chegada de novas grupos ou etnias na ilha revolucionaram as vivendas ilhotas portando a técnica de fabricar cerâmica. Suas cabanas, de planta circular, eram agrupadas em pequenos vilarejos costeiros.
A indústria lítica prosseguia a tradição mesolítica. A maioria das peças era composta de micrólitos de obsidiana ou sílex. Ossos eram trabalhados para servirem tanto como armas quanto como ferramentas. Foram achadas bolas oblongas de argila, provavelmente usadas nas fundas.
Durante essa fase, as populações viviam em casas retangulares (exceto em Chipre), sobre um piso de argila. Suas paredes eram feitas de postes de madeira que sustentavam um reticulado de canas e ramagens, talvez recobertos por folhagens. Em alguns sítios, os pisos eram rebaixados.
Essas casas muitas vezes apresentam sinal de incêndio, o que leva à hipótese de terem sido destruídas por grupos chegados do exterior.
Fase Proto-Sesklos
A neolitização das comunidades da Tessália foi surpreendente. O número de assentamentos permanentes se multiplicou, ao tempo em que mirrava o número de assentamentos mesolíticos entre 6.000 e 5.300 a.C. Quando a cerâmica já estava sendo produzida no local, a distância média entre os assentamentos raramente ultrapassava os 5 quilômetros. E três quartos deles ainda existia no Neolítico Médio, demonstrando a estabilidade dessas sociedades.
Mas o processo se espalhou rapidamente e em pouco tempo ia da Beócia, no sudeste da Grécia Central, até a Macedônia.
No Período inicial de produção de cerâmica, essas comunidades já criavam ovinos e caprinos. Em Sesklos, na magoula Souphli e Achilleion continuava o cultivo das mesmas espécies vegetais do Período acerâmico.
A cerâmica do Período inicial produzida em Arguissa eram utensílios cozidos pelo fogo, na forma de tijelas semi-esféricas e jarras com um buraco a título de bocal. também na caverna de Franchti se achou um número grande de utensílios da mesma espécie.
Na fase proto-Sesklos, a cerâmica era já muito variada e mais bem feita. Vários tipos de base surgiram, algumas das peças eram até dotadas de pés. A coloração era geralmente vermelha ou rósea. A decoração no Período inicial eram na forma de pintura vermelha sobre uma base branca.
O sítio mais antigo e rico dessa fase foi Nea Nicomedeia, ocupada entre 6.200 e 5.300 a.C. como um acampamento ao ar livre. Suas habitações eram retangulares e distribuídas desordenadamente dentro de um perímetro cercado por u'a mureta baixa. As casas tinham dimensões médias de 8X8 metros quadrados e sobre uma base de pedras se erguiam postes de carvalho a título de paredes. Os tijolos de barro já usados na Mesopotâmia eram ali desconhecidos.
Quatro casas do Período inicial estavam circundando uma edificação mais ampla, de 12 metros de comprimento, que seria um templo, a casa de algum membro destacado da sociedade ou, até mesmo, a sala do conselho de anciãos que administraria a cidade. No interior desse edifício maior estavam estatuetas femininas feitas de argila crua, dois machados grandes feitos de pedra verde, ânforas e taças.
Posteriormente, a mureta foi substituída por um fosso profundo. Nenhum dos dois apresentam caráter defensivo e tudo indica que objetivavam manter o local livre da umidade.
Em Nea Nicomedéia, além do consumo de trigo, cevada, ervilhas e ervilhacas, achou-se ossos de peixes e de caça.
A cerâmica mais abundante é monocromática, algumas com pinturas padronizadas. Nas camadas mais antigas, havia vasos decorados à unha, vasos com tinta vermelha sobre fundo branco e com tinta branca sobre fundo vermelho ou marrom. Aparecia na Beócia uma forma de cerâmica batizada como Queronça, com decoração escura sobre fundo claro.
Foram deixados alguns carimbos para imprimir formas geométricas nos utensílios. As estatuetas femininas em terracota tinham os olhos em ranhura e os traseiros gordos.
Adornos, machados e figuras zoomorfas em pedra faziam companhia a agulhas, alfinetes e anzóis em osso nos restos desse vilarejo. Cabos de madeira ou osso eram colocados em ferramentas de pedra. impressão deixada na cerâmica mostra a fabricação de cestos.
Os mortos de Nea Nicomedeia e nos outros aldeamentos eram enterrados dentro do perímetro urbano, em posição flexionada, dentro de covas rasas ao relento ou dentro de construções em ruínas. Os cadáveres não eram acompanhados de objetos pessoais.
Fase Sesklos
No norte da Tessália, na fase proto-Sesklos, aparece uma cultura intrusiva vinda do norte ou do noroeste por volta de 5.700 a.C. A essa fase se denomina pré-Sesklos. Essa fase foi o embrião das gentes da Cerâmica Impressa Cardial.
Na Tessália e Grécia Central, a fase Proto-Sesklos evolui para a Cultura Sesklosense, que existiu entre 5.800 e 4.400 a.C. Essa cultura absorveu a dos Cardinais (fase pré-Sesklos), pelo menos nessas duas regiões. Ela se espalhou por toda a área entre a Sérvia e Lianothladhi (Phtiotis, Grécia).
A Cultura de Sesklos se expandiu também rumo ao norte, chegando à Bulgária e à Iugoslávia. Iniciavam-se aí a gestação das Cultura de Starcevo (Sérvia-Croácia), Körös (Hungria), Cris (Romênia) e Karanovo (Bulgária), do complexo cultural denominado da Cerâmica de Faixas Lineares.
Segue o Neolítico Inicial europeu
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