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CADERNOS DE VIAGEM

AMÉRICA DO NORTE - Estados Unidos - Louisiana

Nova Orleans

Não há nos Estados Unidos lugar de maior riqueza cultural que a Louisiana. Nova York se proclama o melting pot (cadinho de fusão) norte-americano, mas enquanto as diversas culturas ali existentes se mantém apenas justapostas, na Louisiana elas se fundiram e criaram uma cultura toda própria, a cajun ou creole.

Em 1682 René Cavelier de la Salle desceu o vale do Mississipi e reclamou o território para o rei da França.

A Louisiana é parte desse território. Os irmãos franco-canadenses, Pierre Le Moyne (senhor de Iberville) e Jean Baptiste le Moyne (senhor de Bienville), moradores no Canadá francês, partiram do porto de La Rochelle em 1698, a mando do rei Luis XIV, para descer o Mississipi até o delta do rio, no Golfo do México. O senhor de Iberville e um grupo de índios contatados subiram o bayou La Fourche (O Garfo) e chegaram à atual Baton Rouge. Entre 1698 e 1717, eles plantaram no território diversos povoados de colonos na área (em Mobile, nas praias ocidentais de Biloxi Bay e em Natchez).

Em 1712 havia apenas onze homens na região que não eram funcionários da Coroa. Havia 124 soldados, alguns padres, 38 mulheres, a maioria das quais deportadas das prisões e bordéis da França, e algumas dezenas de crianças. Diante da reclamação de um padre, que queria deportar as depravadas para elevar o nível moral da região, o governador Lamothe Cadillac observou que se fizesse isso, não restaria mulher na Louisiana.

A capital do território foi estabelecida em Biloxi, hoje estado do Mississipi.

No ano de 1714, antes da construção de Nova Orleans, franceses liderados por Louis Juchereau de Saint Denis ergueram um posto comercial e o forte de Saint Jean Baptiste à margem esquerda do rio Cane, perto da aldeia dos índios Natchitoches (pron. nacátoches). O forte visava proteger o território do avanço dos espanhóis do Texas, que tentavam chegar à região pelo rio Red.

Em 1717 o trono francês franqueou o território para a Companhia das Índias Ocidentais, ali conhecidas como Companhia do Mississipi. Esta importou colonos brancos e escravos negros para trabalhar em minas de ouro e prata, bem como na extração de pérolas.

Perto da vila fortificada dos índios Tchoutchouma, num cotovelo do rio, Bienville mandou limpar a área, infestada de cobras e crocodilos, e ali implantou o Quarteirão Francês, uma cidade de linhas retas, batizada de Nouvelle Orleans. Ela seria a guardiã do rio, defendendo o território contra a entrada de espanhóis e ingleses.

Para lá foram deslocados os acadiens franco-canadenses, quando os ingleses passaram a invadir áreas francesas no Canadá. Esse adjetivo gentílico foi corrompido até chegar ao atual cajun, muito usado para qualificar a cozinha e a música locais.

barcaça do Mississipi

Quando do casamento do rei da Espanha, o monarca francês deu a esse rei, seu primo, os territórios americanos como presente de casamento. E a Lousiana esteve sob a Coroa da Espanha de 1764 a 1803. Desse tempo, porém, só restam poucas lembranças, como a palavra cabildo, que designa a casa de vereança, a denominação creole (do espanhol criollo, pessoa branca, descendente de espanhol, mas nascida na América) e os nomes espanhóis das ruas, geralmente adaptados dos nomes franceses (como Burbón para Bourbon). Da era francesa ficaram os termos banquette, que localmente substituem o inglês pavement para calçada, e os nomes de diversos alimentos: beignet (uma espécie de broa local), café-au-lait (café com leite), ettouffe (cozido de arroz, lagostim e temperos fortes) etc.

Com os espanhóis vieram mais escravos e a cana-de-açúcar.

Com o enriquecimento da população local, eles pensaram em criar um estado independente, mas o sonho se foi quando chegou o governador Alejandro O'Reilly e três mil soldados. Esse governador mandou prender os patriotas Villère, La Frémière, Carasse, Marquis e Milhet. O primeiro morreu na prisão e os demais foram executados no Fort Saint Charles a 25 de outubro de 1769.

O governo de Napoleão retomou as terras para a França em novembro de 1803, quando invadiu a Espanha. Todavia, para não abrir nova frente de batalha, as vendeu dois meses depois aos Estados Unidos.

Ao contrário do resto do país, a Louisiana não é dividida por condados (counties) mas por freguesias ou paróquias (parish), herança da colonização latina.

Na primeira visita que fizemos à cidae, viemos de Nova Iorque. Para chegar à cidade, o trem passa sobre o lago Pontchartrain, um extraordinário lago, dezenas de vezes maior que a baía de Guanabara. São mais de vinte minutos só vendo água de lado a lado. O trem balança e range, andando bem devagarinho, parecendo ter medo de cair no lago. Ao contrário da maioria das pontes, aquela não tinha qualquer proteção lateral.

Nova Orleans estava, como é comum nessa época, um forno. O tempo todo assim, vapor de dia e chuva vez por outra. A região a leste do Quarteirão Francês, onde nos instalamos tão logo chegamos, parece um subúrbio do Rio de Janeiro. É mal-iluminada, quente, úmida e boa parte dos habitantes é negra, a maioria deles pobremente vestida.

O sotaque do pessoal é mais fácil, embora o som AR soe como OR em "car", "square", "hard" .... O povo da Louisiana é, em geral, muito simpático.

O Vieux Carrè ou French Quarter é o núcleo original da cidade dos franceses, que colonizaram o local, como de resto lhes pertencia toda a região central dos Estados Unidos e Canadá. É um bairro seguro, principalmente para os lados da Canal St.

A região era muito susceptível a enchentes, pois ainda hoje se vê que a cidade e redondezas ficam em nível abaixo do rio. Boa parte do local é protegida por levees, barricadas de terra, muitas vezes cobertas com placas de cimento, para que o rio não as eroda.

A maioria das casas é de dois ou três andares, construída no século passado e guarda a arquitetura francesa, com sacadas. Muitas ostentam placas indicando sua condição de local histórico, tais como a Casa Girod, na esquina da rua Chartres com a St. Louis, construída em 1797 por Claude François Girod e que depois foi de seu irmão Nicholas Girod, prefeito de Nova Orleans de 1812 a 1815. Este prefeito ofereceu a casa para quartel-general de Napoleão, em sua campanha para a retomada do poder. Outros dizem que a casa foi cedida como quartel-general das forças que iriam resgatar o imperador francês do exílio.

 

Olde Absite House

Defronte a essa casa fica o local onde eram comercializados os escravos. Ali o gen. Jackson se encontrou com o pirata Jean Laffitte para planejar a batalha de Nova Orleans, onde os ingleses foram derrotados pelas forças americanas e dos piratas, na guerra de independência americana. Os piratas e os americanos da cidade tinham na Olde Absinte House a taverna preferida. 

Outro edifício histórico é o Convento das Ursulinas, a mais velha construção do Vale do Mississipi ainda em pé, datada de 1745. Fica na rua das Ursulinas com a Bourbon. Ele abrigou os órfãos dos colonos franceses mortos no Fort Rosalie no Massacre Natchez. A História guardou o nome de algumas dessas crianças: Louise Chalante, Françoise Caillon e Marie le Pris.

Na rua Dumaine se pode ver a casa construída em 1788 e que foi de Manuel Lanzos, capitão do exército espanhol. Nesse mesmo terreno ficava uma casa de 1725, construída por Jean Pascal, marinheiro assassinado no massacre natchez de 1729. A casa ficou para a viúva, que morreu em 1777.

Um incêndio em 1788 destruiu 856 dessas casas antigas. Seis anos depois, outro incêndio levou mais 212 edifícios. O governador Carondelet, então, mandou que as casas fossem reconstruídas em alvenaria.

Há brochuras que descrevem todos esses lugares e seus habitantes. Nós recomendamos a New Orleans Historical Guide, de René Beaujolais.

Com a venda das possessões francesas aos americanos, colonos da Nova Inglaterra se mudaram para a região. Recusados pela requintada sociedade local e reprovando os costumes cajuns, eles se estabeleceram do outro lado da Canal St., numa fazenda que tinha sido de Louis Bouligny (1761-1862), região hoje cortada pela Charles St.

Aqui e acolá ladrilhos nas paredes perto das esquinas mostram os nomes das ruas em francês, espanhol e inglês. O pessoal fala esses nomes com sotaque americano e só no interior (perto de Laffayette ou Thibaudeaux) se acha uma ou outra colônia onde o francês é língua corrente.

vista do World Trade Center

A cidade pode ser vista de cima no World Trade Center, um prédio alto às margens do rio Mississipi, no qual há um lindo observatório no 31º andar. Dali se descortina Nova Orleans e as cidades vizinhas. Em baixo, o rio com suas curvas e suas barcaças.

O rio é escuro, muito largo e profundo. Enormes petroleiros navegam por ele.

As barcaças, típicas da região, eram, no passado, movidas por gigantescas pás em forma de roda d'água existentes em sua parte traseira. Tais pás eram movidas por motores a vapor.

Hoje, as pás são praticamente para enfeite, com exceção de cinco das barcaças (a Natchez é uma delas). Elas servem para navegação turística sobre o enorme rio Mississipi, em passeios de até duas horas. A barcaça, de nome Natchez, é uma das 5 últimas que utilizam de fato as rodas movidas a óleo para propulsão e não como mera fantasia.

Antigamente, os passeios eram de quatro horas e as barcaças passavam por diversas eclusas (que servem para regular os níveis das águas do rio e do lago Portchartrain) e entravam pelo bayou) Barataria, onde tinha seu esconderijo o pirata e traficante de escravos Jean Laffite, que ajudou os americanos a se livrarem dos ingleses na Batalha de Nova Orleans.

Logo na saída, o barco passa pelas docas do porto (o mais movimentado porto fluvial do mundo). Quando estivemos em Nova Orleans pela primeira vez, havia nas paredes de um dos edifícios das docas uma inscrição pichada onde se lia: "Teresa, a rainha do brechó". Assim mesmo, em bom português. Ficou a dúvida se essa Teresa seria finlandesa ou grega ...

Da barca se vê as casas da cidade num nível abaixo do nível do rio, justificando a existência dos levees (barrancos de proteção contra as enchentes) por todo canto. Sem eles, Nova Orleans viveria sendo inundada.

Durante o passeio, o capitão conta que o rio Mississipi só é menor que o Amazonas. E volta a falar do Brasil quando mostra uma usina de açúcar (a Domino Sugary), dizendo que era a segunda maior do mundo, atrás de uma existente no Brasil.

 

Segue Nova Orleans ...

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