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CADERNOS DE VIAGEM

AMÉRICA DO NORTE - Estados Unidos - Louisiana

Nova Orleans (parte 3)

Já a noite é na Bourbon Street, onde durante 24 horas você pode encontrar bares nos quais músicos tocam rock, blues, jazz, zydeco, cajun music, country music ...

A música creole ganhou formas novas quando os músicos, principalmente negros pobres, puderam comprar dos soldados confederados vencidos na Guerra de Secessão, seus instrumentos a baixos preços. Isso lhes permitiu incorporar os metais e a percussão a seus ritmos, plantando a semente dos ritmos negros do sul dos Estados Unidos (jazz, blues, gospel, soul etc). A música cajun e o zydeco são ritmos que misturam sonoridades coloniais francesas, espanholas, escocesas, alemãs, índias e, principalmente, afro-caribenhas.

Seu ritmo é quente e alegre, apoiado no som de rabecas e acordeões. As canções mais antigas têm temas tipicamente europeus, como a La Guerre de Sept Ans. O clássico do gênero e a canção mais gravada é Jolie Blonde, principalmente seu refrão:

 

Jolie Blonde, regardez donc quoi t'as fait
Tu m'as quitté pour t'en aller

Num dos bares da Bourbon St. que entramos estava no palco um cantor de música country já devidamente alcoolizado. Como é de praxe, perguntou de onde éramos, para cantar alguma canção da nossa terra. Quando respondemos que éramos do Brasil, ele virou para o lado e comentou com um casal que assistia ao show que não sabia nenhuma música em espanhol. O cliente cortou: "eles falam português e não espanhol". E para sacanear, disse ao cantor: "toque uma lambada ...". Na saída, o casal veio falar conosco, dizendo que era de Miami. Daí entendemos porque sabiam tanto sobre o Brasil, coisa inusitada entre os americanos.

As feras do jazz se exibem no Preservation Hall, um salão pobre, com alguns bancos compridos de madeira e muita disputa pelos ingressos. É engraçado que antes de cada sessão os músicos deixam bem claro que não se pode tirar fotos ou filmar a jam session. E não há uma única vez em que turistas não entendam e quebrem a regra.

Outros estabelecimentos nessa rua oferecem espetáculos de strip-tease. Da rua você vê moças seminuas, deitadas em divãs e refletidas em espelhos de teto no interior das casas comerciais. Outras casas têm vitrines, onde moças seminuas dançam. Às vezes você vê moças em trajes íntimos virem à porta para convidar os passantes para um drinque.

Quem vai a Nova Orleans não consegue deixar de perceber que as comidas típicas de lá, a cajun e creole cuisine diferem de tudo quanto há no resto dos Estados Unidos. Dessa cozinha é a jambalaya (imortalizada na música de Hank Williams e que no Brasil fez sucesso na voz de Brenda Lee), o gumbo (derivado de kambo, termo chactaw, uma tribo local, para açafrão) ou vir do francês jambón (presunto) e de ya, que em um dialeto africano significa arroz), o feijão vermelho, o mega-sanduíche po-boy (forma de os pretos falarem poor boy, normalmente o tipo de pessoa que consumia esse alimento barato), o crawfish (um lagostim muito comum na área do Delta) e inúmeros outros pratos e comidas só encontradas na Louisiana, a maioria com nomes franceses. Todos esses pratos são muito apimentados. A jambalaya3 é um arroz com pedaços de salsicha ou lingüiça super-apimentados. O gumbo é uma sopa de frutos do mar e há uma enorme variedade de pratos, principalmente com frutos do mar.

Canal Street

Charles Street

Um passeio interessante é atravessar a larga Canal St., entrar pelo centro financeiro e lá pegar o bonde na Charles St. Esse bonde começou a rodar em 1835, ligando Nova Orleans a Carrolton Town. Ele segue por um canteiro central gramado e cercado de árvores. Nas laterais, as pistas para automóveis. Cruza o bairro americano, cuja arquitetura tem um quê de inglesa, contrastando vivamente com a do French Quarter.

Passa-se por uma antiga fazenda de Louis Bouligny (1761-1862), pela Loyola University e pelo Audubon Park, onde fica o Jardim Zoológico. Descendo na primeira parada após o bonde entrar na Carrolton Ave, se pode ver uma curva do rio Mississipi e a cidade de Algiers na margem oposta.

Prédio em Carrolton

Na volta, descemos e fomos ver o Superdome, um enorme estádio de beisebol com o teto retrátil.

Um pouco afastado do Quarteirão Francês fica o Museu da Guerra Civil, no qual são exibidos uniformes, armas, fotos e documentos da época dessa guerra. Dá para comprar alguns fac-símiles de jornais, bem como fitas de músicas da época. O museu é muito pequeno, mas conservado com o cuidado com que os sulistas conservam a memória dos confederados.

Museu da Guerra Civil

Outro must em Nova Orleans é o vudu, uma espécie de macumba de origem haitiana. Em 1790 houve na ilha de Santo Domingo, no Caribe, uma sublevação que fez com que vários cidadãos se mudassem do Haiti para a Louisiana, também francófona. Essa gente trouxe seus escravos e com eles o vudu. O expoente máximo dessa arte foi Marie Laveau (1799-1859), uma mulata livre vinda do Haiti e que foi muito temida na cidade por negros e por brancos pelos seus gris-gris (despachos). Os despachos assumiam diversas formas, tais como bonecos representando o desafeto, que eram espetados para provocar dor no ser vivo, uma pena atada a um osso, sal derramado nos degraus de acesso à casa, uma pedra de um cemitério ...Serviam para o mal e para o bem, como despertar o amor de um homem ou mulher, propiciar riquezas e assim por diante.

Cemitério St. Louis One

Marie Laveau está enterrada no cemitério Saint Louis One, na Rampart Street, mas o local é ermo e me recomendaram para não ir lá sozinho. Ela foi sucedida por sua filha de igual nome. Contam que ainda em 1950 se praticava o vudu em Nova Orleans.

 

Mardi Gras

Para encerrar, registramos que a Louisiana tem um dos maiores carnavais do mundo, o Mardi Gras (Terça Gorda, em português). Alguns americanos dizem que é o maior do mundo. Outros, melhor informados, reconhecem que o do Rio de Janeiro é maior. Nenhum, porém, conhece os carnavais de Recife e de Salvador, senão ele cairia para um mais realista terceiro ou quarto lugar. De qualquer forma, é uma festa grandiosa e colorida, onde o zydeco e o jazz substituem o samba.

Segue Baton Rouge ...

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