Já a noite é na Bourbon Street, onde durante 24 horas você pode encontrar bares nos quais músicos tocam rock, blues, jazz, zydeco, cajun music, country music ...
A música creole ganhou formas novas quando os músicos, principalmente negros pobres, puderam comprar dos soldados confederados vencidos na Guerra de Secessão, seus instrumentos a baixos preços. Isso lhes permitiu incorporar os metais e a percussão a seus ritmos, plantando a semente dos ritmos negros do sul dos Estados Unidos (jazz, blues, gospel, soul etc). A música cajun e o zydeco são ritmos que misturam sonoridades coloniais francesas, espanholas, escocesas, alemãs, índias e, principalmente, afro-caribenhas.
Seu ritmo é quente e alegre, apoiado no som de rabecas e acordeões. As canções mais antigas têm temas tipicamente europeus, como a La Guerre de Sept Ans. O clássico do gênero e a canção mais gravada é Jolie Blonde, principalmente seu refrão:
Jolie Blonde, regardez donc quoi t'as fait |
Tu m'as quitté pour t'en aller |
Num dos bares da Bourbon St. que entramos estava no palco um cantor de música country já devidamente alcoolizado. Como é de praxe, perguntou de onde éramos, para cantar alguma canção da nossa terra. Quando respondemos que éramos do Brasil, ele virou para o lado e comentou com um casal que assistia ao show que não sabia nenhuma música em espanhol. O cliente cortou: "eles falam português e não espanhol". E para sacanear, disse ao cantor: "toque uma lambada ...". Na saída, o casal veio falar conosco, dizendo que era de Miami. Daí entendemos porque sabiam tanto sobre o Brasil, coisa inusitada entre os americanos.
As feras do jazz se exibem no Preservation Hall, um salão pobre, com alguns bancos compridos de madeira e muita disputa pelos ingressos. É engraçado que antes de cada sessão os músicos deixam bem claro que não se pode tirar fotos ou filmar a jam session. E não há uma única vez em que turistas não entendam e quebrem a regra.
Outros estabelecimentos nessa rua oferecem espetáculos de strip-tease. Da rua você vê moças seminuas, deitadas em divãs e refletidas em espelhos de teto no interior das casas comerciais. Outras casas têm vitrines, onde moças seminuas dançam. Às vezes você vê moças em trajes íntimos virem à porta para convidar os passantes para um drinque.
Quem vai a Nova Orleans não consegue deixar de perceber que as comidas típicas de lá, a cajun e creole cuisine diferem de tudo quanto há no resto dos Estados Unidos. Dessa cozinha é a jambalaya (imortalizada na música de Hank Williams e que no Brasil fez sucesso na voz de Brenda Lee), o gumbo (derivado de kambo, termo chactaw, uma tribo local, para açafrão) ou vir do francês jambón (presunto) e de ya, que em um dialeto africano significa arroz), o feijão vermelho, o mega-sanduíche po-boy (forma de os pretos falarem poor boy, normalmente o tipo de pessoa que consumia esse alimento barato), o crawfish (um lagostim muito comum na área do Delta) e inúmeros outros pratos e comidas só encontradas na Louisiana, a maioria com nomes franceses. Todos esses pratos são muito apimentados. A jambalaya3 é um arroz com pedaços de salsicha ou lingüiça super-apimentados. O gumbo é uma sopa de frutos do mar e há uma enorme variedade de pratos, principalmente com frutos do mar.
Um passeio interessante é atravessar a larga Canal St., entrar pelo centro financeiro e lá pegar o bonde na Charles St. Esse bonde começou a rodar em 1835, ligando Nova Orleans a Carrolton Town. Ele segue por um canteiro central gramado e cercado de árvores. Nas laterais, as pistas para automóveis. Cruza o bairro americano, cuja arquitetura tem um quê de inglesa, contrastando vivamente com a do French Quarter.
Passa-se por uma antiga fazenda de Louis Bouligny (1761-1862), pela Loyola University e pelo Audubon Park, onde fica o Jardim Zoológico. Descendo na primeira parada após o bonde entrar na Carrolton Ave, se pode ver uma curva do rio Mississipi e a cidade de Algiers na margem oposta.
Na volta, descemos e fomos ver o Superdome, um enorme estádio de beisebol com o teto retrátil.
Um pouco afastado do Quarteirão Francês fica o Museu da Guerra Civil, no qual são exibidos uniformes, armas, fotos e documentos da época dessa guerra. Dá para comprar alguns fac-símiles de jornais, bem como fitas de músicas da época. O museu é muito pequeno, mas conservado com o cuidado com que os sulistas conservam a memória dos confederados.
Outro must em Nova Orleans é o vudu, uma espécie de macumba de origem haitiana. Em 1790 houve na ilha de Santo Domingo, no Caribe, uma sublevação que fez com que vários cidadãos se mudassem do Haiti para a Louisiana, também francófona. Essa gente trouxe seus escravos e com eles o vudu. O expoente máximo dessa arte foi Marie Laveau (1799-1859), uma mulata livre vinda do Haiti e que foi muito temida na cidade por negros e por brancos pelos seus gris-gris (despachos). Os despachos assumiam diversas formas, tais como bonecos representando o desafeto, que eram espetados para provocar dor no ser vivo, uma pena atada a um osso, sal derramado nos degraus de acesso à casa, uma pedra de um cemitério ...Serviam para o mal e para o bem, como despertar o amor de um homem ou mulher, propiciar riquezas e assim por diante.
Marie Laveau está enterrada no cemitério Saint Louis One, na Rampart Street, mas o local é ermo e me recomendaram para não ir lá sozinho. Ela foi sucedida por sua filha de igual nome. Contam que ainda em 1950 se praticava o vudu em Nova Orleans.
Para encerrar, registramos que a Louisiana tem um dos maiores carnavais do mundo, o Mardi Gras (Terça Gorda, em português). Alguns americanos dizem que é o maior do mundo. Outros, melhor informados, reconhecem que o do Rio de Janeiro é maior. Nenhum, porém, conhece os carnavais de Recife e de Salvador, senão ele cairia para um mais realista terceiro ou quarto lugar. De qualquer forma, é uma festa grandiosa e colorida, onde o zydeco e o jazz substituem o samba.
Segue Baton Rouge ...
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