Atravessando uma serra alta e coberta por uma relva baixa e amarronzada se chega a Whitby (1), onde o rio Esk entra no mar. Um par de quebra-mares torna a foz do rio Esk mais dócil. Ali morava o famoso capitão Cook.
A cidade fica à beira do rio, pequeno, escuro, feio, cheio de barcos pesqueiros. Seu centro fica espremido entre duas colinas, a East e a West Cliffs.
Sobre o Esk ligando as duas margens há uma ponte (Swing Bridge) que se abre para passar barcos maiores. Há uma ponte mais nova (a New Bridge), no subúrbio da cidade, para desafogar o trânsito. A cidade estava toda tomada por turistas.
A cidade, principalmente a parte baixa, guarda todas as características de um porto de piratas. As ruas são estreitas e sem alinhamento. As casas, irregulares e juntinhas, povoam densamente a vila.
Já no West Cliff as ruas são perpendiculares entre si. Um parque acompanha a praia no alto da colina. Na parte do parque que fica defronte ao pier estão os monumentos ao cap. Cook e a Whalebone Arch (um arco formado por duas costelas de baleia e que servem de porta para o parque). Dali descem as escadas que vão dar na Whitby Sands, uma praia marítima de areia grossa, mas sem pedras ou musgo.
Na margem oriental do rio fica o museu que conta a vida do capitão Cook, um filho dileto da cidade, descobridor da Austrália e morto no Havaí por nativos.
Nesse mesmo lado da cidade fica a Church Street, um (calçadão) apinhado de gente e de artistas tocando música ou expondo suas obras. Nela começa a escadaria de 199 degraus que levam ao topo do East Cliff, onde estão as ruínas da abadia e igreja de St. Mary. Uma garotinha descia contando os degraus em voz alta e confirmou o número com um sorriso.
Aos pés do penhasco fica a Henrietta Street e logo após ela a Tale Hill Sands, uma praia fluvial, de maré, cheia de pedras cobertas de musgo.
A abadia de St. Peter e Santa Hilda foi erguida no século XI no lugar onde ficava o mosteiro de Santa Hilda, sobrinha do rei Oswy, nascida em 614.
Tornou-se abadessa do mosteiro de Hartlepool e fundou em 657 um mosteiro na colina então chamada de Streonshalh (hoje East Cliff).
Na abadia se deu o célebre Sínodo de Whitby entre 663 e 669. O encontro foi convocado pelo rei Oswy, da Northumbria, protetor da abadia de Santa Hilda.
No Sínodo estavam presentes figuras de destaque como o diácono James Wilfrid (abade de Ripon) e Agoberto (bispo dos Saxões Ocidentais), representando o ponto de vista romano. Pelo lado celta, Colman (abade de Lindisfarne), Cedd e a abadessa Hilda.
Um dos temas centrais era o estabelecimento da época da Páscoa. Os celtas a celebravam entre 22 de março e 25 de abril, no primeiro domingo após a lua cheia que coincidisse ou seguisse ao equinócio "vernal", visível influência druídica. Já os de linha romana o definiam baseada no calendário lunar típico dos judeus. Venceu a corrente românica.
Até sua destruição pelos dinamarqueses, Whitby teve projeção entre os mosteiros da Grã-Bretanha.
Hilda foi sucedida por Eanfleda, a viúva do rei Oswy. O mosteiro se converteu no mausoléu real da família governante na Northumbria.
No mosteiro estudaram bispos, tais como Oftfor (de Worcester), Bosa e Wilfrid (de York), Aetla (de Dorchester) e John (de Hexham), assim como Caedmon, o primeiro poeta inglês.
Também ali foram sepultados santos anglos, cujos despojos visavam atrair peregrinos, e figuras da elite local:
Conta-se que algumas tradições escandinavas estão ligadas à região. Entre elas a da Church-Grim (equivalente à sueca Kirke Grim ou à dinamarquesa Kirke Varsel). Quando uma igreja estava prestes a ser acabada, o último animal que cruzasse o caminho que dava a ela era emparedado vivo para servir de espírito guardião do templo. O espírito do guardião apareceria ao pároco quando este encomendasse um cadáver sozinho e pelas características do espectro, o pároco poderia saber se seu paroquiano estava se encaminhando para o céu ou para o inferno.
Após a destruição da abadia pelos viquingues da Dinamarca, os normandos a reergueram em 1073, maior e mais bela. Reinfrid, cavaleiro de Guilherme, o Conquistador, ali tomou vida ascética e se tornou abade.
O segundo fim do templo veio com a Peste Negra de 1349, que dizimou os monges, e com a Reforma, em 1536.
As ruínas da abadia se destacam em meio a um enorme gramado, no topo do East Cliff de Whitby (ou Pristibi, nome dado pelos dinamarqueses). Ao lado das ruínas da abadia fica a igreja de St. Mary, a igreja paroquial, do século XII. Uma antiga história diz que quem ficar no pórtico da igreja de St. Mary na véspera do dia de São Marcos (24 de abril) poderá ver uma procissão de fantasmas.
Lerlo de Percy se tornou prior de Whitby em 1087. Depois foi a vez de William de Percy (1092-1129), o primeiro abade da era normanda de Whitby. Nesse período foi construída a igreja de St. Mary.
Em volta da igreja fica o cemitério local. Ali jazem, por exemplo, as vítimas dos três surtos de cólera que atingiram Whitby em princípios do século XIX; os Scorebys, pai e filho, os maiores baleeiros ingleses do século XIX; marujos afogados no desastre que ocorreu em 1861 com um barco salva-vidas.
Em algumas ocasiões, o rochedo cedeu (em 1793, por exemplo, destruiu boa parte da Henrietta Street) e diversos caixões caíram na parte baixa da cidade.
A vista das ruínas e do cemitério na parte alta da cidade, que então se iluminava à luz de lampiões, inspirou Bram Stoker a começar a escrever o mundialmente conhecido romance sobre o conde Drácula. Pelo livro, o conde se instalou em Whitby quando ia à Inglaterra a bordo da escuna russa Demetrio, que bateu nos rochedos do East Cliff numa violenta tempestade. O conde, na forma de um cachorro, pulou da escuna em direção ao cemitério e ali se instalou. Sua primeira vítima foi a jovem Lucy, que estava em férias com sua mãe em Whitby e costumava apreciar a paisagem sentada sobre a tumba de um suicida enterrado naquele cemitério.
Aliás, Whitby é outro centro de histórias de terror. Alamedas e becos escuros, luzes de lampiões e, eventualmente, as lápides defronte a lua cheia criavam um clima propício para o medo. Junte-se a isso as Pestes e as histórias trazidas pelos marujos que movimentavam o porto. Tudo levando aos Contos da Cripta.
Um livreto ali vendido (The Whitby Ghost Book) conta várias dessas histórias, envolvendo homicídios ali cometidos, espíritos dos que se foram, coches fúnebres andando no meio da noite, cavalos sem cabeça ...
Num desses contos, os piratas atacaram um navio. Tanto o capitão quanto sua mulher tiveram de andar na prancha. Antes de atirar a mulher ao mar, um dos piratas tomou o xale de seda que ela levava sobre os ombros. Voltando a casa, deu a peça a sua amada esposa, que o achou maravilhoso, mas não contou a ela de onde o tinha conseguido. Quando a mulher o ajeitava sobre os próprios ombros diante do espelho, neste surgiu o espectro da mulher afogada, apontando um dedo acusador para o xale. A mulher do pirata endoideceu e morreu pouco depois.
Segue para York ...
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